“Diferenças, resiliência e democracia” ou “Porquê vou às ruas no dia 15”

Ricardo Young

Nunca gostei de extremos.

Desde que dei os primeiros passos na política, ainda no movimento estudantil, sentia grande desconforto em relação aos estereótipos da época, em que, ou você apoiava a ditadura, ou era comunista. Essa dicotomia não refletia as filosofias que à época eu experimentava. Não satisfazia minhas aspirações de país.

Foi um período em que pudemos experimentar a mão pesada do Estado, que cala, reprime e mata. Levamos 20 anos para derrubar esta ditadura e conquistarmos o direito de escolher de forma democrática nossos governantes. Há quase mais 30 anos vivemos em um país democrático e esta não é uma vitória banal.

Temos hoje uma gama de partidos que deveria ser capaz de refletir qualquer pensamento. Ainda assim, me vejo imerso em um cenário que me fazem sentir como se tivéssemos voltado àquele tempo, de um ou outro, isso ou aquilo.

Este quadro de polarização foi meticulosamente desenhado pelos principais interessados nele. Convencer a todos de que não há muito mais coisas entre o céu e a terra só interessa a quem quer se favorecer daqueles que estão em uma ponta ou outra.

Alimenta-se o maniqueísmo e as falsas imagens de que, ou estamos à beira do caos, ou estamos na mais perfeita ordem.

Ouvi da minha casa panelas sendo batidas no último domingo enquanto a presidente Dilma fazia seu pronunciamento. Tenho também recebido pelas redes sociais inúmeros convites para manifestações em que, novamente, tenho que escolher a data em que vou às ruas como se elegesse um lado em uma batalha.

Acredito firmemente que a população deve exercer seu direito de manifestação. Não deve calar-se diante de qualquer inquietação. Contudo, há a necessidade de se ter clareza dos motivos que nos fazem deixar o sofá.

É fato que o país passa por uma profunda crise e a inércia não pode mais ser tolerada. Negar os problemas é permitir a erosão da democracia. Mas, beira o estapafúrdio pedir um impeachment sem que se cumpram as etapas de investigação e julgamento. Se houver culpa, as investigações mostrarão. Cabe-nos acompanhar de perto para que estas sejam feitas com ética e transparência.

Estarei na Avenida Paulista no próximo domingo, dia 15. Estarei lá para pedir rigor na apuração e punição dos responsáveis pelos esquemas de corrupção que ocupam as entranhas de todas as esferas de poder. Esquemas estes que sei, nasceram muito antes de o PT chegar ao Executivo, mas que tem se agravado na última década.

Estarei lá para dizer que sim, reconheço que a presidente foi legitimamente eleita em um processo democrático. Mas estarei lá para dizer, principalmente, que também é legítimo o direito do cidadão de ir às ruas expressar seu descontentamento e exigir o cumprimento das promessas feitas durante a campanha.

Na rede da política não há a possibilidade de se excluir um nó somente porque não gosta dele. É preciso lutar pelo fortalecimento das instituições, não coloca-las a prova. A polarização nos impede de ver o caminho do meio, do diálogo, da mediação e do senso crítico.

As manifestações são um processo democrático que faz avançar o controle social sobre as instituições e o controle dos eleitores sobre a qualidade de seus políticos. É preciso afastar a sedução golpista e fazer evoluir a participação direta e verdadeira, a única capaz de efetivamente aprimorar a qualidade da política no Brasil.

Assim como as jornadas de junho de 2013, os movimentos que agora observamos são um tanto amorfos e bastante complexos. Não vejo como compreendê-los antes que aconteçam. Talvez daqui a mais 20 anos eu consiga olhar para trás e observar com mais lucidez essa efervescência. Por hora, sigo meu coração e minha convicções.

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