A (i)mobilidade paulistana e a (não) qualidade de vida da população

São Paulo

A qualidade de vida dos paulistanos é sugada pelo grande buraco negro que a metrópole se tornou.

São quase três horas perdidas diariamente no ir e vir, que puxam para baixo a percepção da população em relação à qualidade de vida na cidade.

Decepção é para mim a palavra que melhor descreve os resultados da pesquisa de mobilidade divulgada ontem (18) pela Rede Nossa São Paulo. Os dados levantados pelo Ibope mostram que, a despeito dos investimentos que vem sendo feitos pelo governo em todas as suas esferas, ir e vir na cidade ainda é uma difícil missão. O trânsito e o transporte coletivo estão respectivamente em 4º e 5º lugares na lista de principais problemas da cidade, perdendo apenas para saúde, segurança e educação, áreas universalmente reconhecidas como as mais problemáticas.

A má qualidade da mobilidade rouba das pessoas quase três horas de seus dias. São 2h46min gastos nos deslocamentos diários.
Esta dificuldade na locomoção puxa para baixo a percepção de qualidade de vida dos paulistanos, que cresceu muito pouco de um ano para o outro. A alta de 61% para 66% no índice de pessoas que consideram ótima ou boa a qualidade de vida na cidade, certamente não foi impulsionada por melhorias nos índices relacionados à mobilidade, já que estes permaneceram estáveis. O fato é que isto é pouco, frente ao empenho e atenção que o tema da mobilidade tem recebido.

A questão do transporte precisa ser compreendida como um meio necessário para que as pessoas ocupem as cidades e assim usufruam de seus espaços. A elevação no percentual dos paulistanos que utilizam carro todos, ou quase todos os dias, que foi de 27% para 38%, é a expressão máxima da privatização do espaço público. A população, não se sentindo segura para movimentar-se com os demais modais, continua optando pelo transporte individual.

Se compararmos este índice aos de cidades mais desenvolvidas, veremos que a divisão entre modais nestas localidades é homogênea, com mais ou menos 30% para cada um deles, divididos em carros, transporte humano, e transporte público. A marca de 38% obtida em São Paulo é emblemática: os demais modais não conseguem atender as expectativas da população.

Ainda que tenha sido alta a aprovação do paulistano para as novas ciclovias e corredores exclusivos para ônibus, com 88% dos entrevistados a favor da ampliação das ciclovias e 90% querendo mais corredores de ônibus, a cultura de utilização destes espaços carece ainda de ações de educação.

Prova disto é a percepção de falta de respeito no trânsito. Enquanto 72% dos pedestres, e 80% dos ciclistas e motociclistas se sentem desrespeitados, apenas 61% dos motoristas de carros estão na mesma situação.

Esta lógica precisa urgentemente ser modificada. Quanto mais seguras as pessoas se sentirem, mais vão usar as ruas, as bicicletas e andar a pé. Quanto mais confiantes e confortáveis estiverem, mais vão usar o transporte público.

Outro importante ponto que foi quase esquecido no levantamento são as nossas calçadas. Elas são elos para os demais modais, além de serem o principal meio de locomoção dos 20% dos paulistanos que andam exclusivamente a pé. Nossas calçadas são verdadeiros campos minados, repletos de buracos. Isso significa que um quinto da população anda em campos minados. Como podemos esperar que elas se sintam bem nas cidades?

A mudança cultural não vem do dia para a noite. Precisa ser induzida e o estado deve ser sujeito ativo neste processo. As melhorias estão acontecendo, mas as mentes dos paulistanos ainda não foram conquistadas. Os usuários de automóveis não trocariam esse meio pelo estado atual dos transportes públicos e bicicletas. Conquistar as mentes passa por democratizar as vias. Para isto, é fundamental que as pessoas se sintam seguras em qualquer modal.

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