Polarização na política: quando a verdade não serve a ninguém
Entre um polo e outro, há muito mais do que supõem os discursos reducionistas de quem quer dividir o país ao meio. A ‘Segunda Paulistana – O Brasil precisa conversar’ foi um chamado àqueles que procuram o caminho do meio
Um cenário político que mais parece um campo de batalha, com exércitos de pregadores de verdades absolutas, que gritam suas profecias àqueles que concordam com elas e repudiam tudo aquilo que não se assemelhe às sua crenças. Esse panorama pouco animador da política nacional parece cada vez mais sólido. Os polos se distanciam em velocidade crescente, separados por um abismo onde residem a crise política, a econômica e aquela que talvez seja a mais preocupante: a de diálogo.
A agressividade é a realidade nas discussões políticas em casa, no trabalho ou no boteco. Foi para entender esse fenômeno que, como foi visto no último domingo, constrói mais muros do que pontes, que o mandato do vereador Ricardo Young (Rede) organizou a Segunda Paulistana – O Brasil precisa conversar, realizada na última segunda-feira (18), na Câmara Municipal de São Paulo.
O encontro reuniu pessoas que tem atuado para construir o caminho do meio e fazer com que a população volte a dialogar. “A complexidade da política nos desafia a construir na diversidade. Toda vez que o impasse chega ao limite, o mais forte consegue se impor e quem perde é a sociedade”, comentou Young em sua fala de abertura. Citando o filósofo francês Edgar Morin, o vereador falou do papel da confiança no outro na construção de novas possibilidades. “A confiança é a humildade básica de que ninguém tem a verdade. Ela não está nem comigo, nem com você. A verdade esta entre nós”, disse o parlamentar, que foi positivo ao lembrar ainda que “um dos grandes avanços deste momento é que todos estão discutindo política, independente de sua posição social”.
O evento foi aberto com um vídeo produzido pela marca de sorvetes Ben & Jerry, em que pessoas que tem uma relação pessoal de afeto e posições políticas divergentes tomam juntas um sorvete, enquanto leem a opinião do outro sobre a crise brasileira e o impeachment da presidente Dilma. “Acho que a gente conseguiu o que queria, que era fazer com que as pessoas lembrassem da sua relação, para além das discussões políticas. São pessoas que se amam, mas discordam. Existem um elemento de união muito mais forte do que o de discordância, que é o amor’, comentou Bruno Guima, da Ben & Jerrys.
Para Pedro Kelson, da Pallas Athena, são estes sentimentos ‘do bem’ que estão faltando na cultura do fazer político. “Existe polarização e os polos são sintomas de uma mesma cultura, a cultura da dominação. A cultura de ganhar e derrotar o outro. A ideologia tem menos peso que a forma como tratamos essas discussões”, disse. Como solução, ele sugere “cidadania na educação”.
A mesma ideia foi defendida por Carla Mayumi. Ela realizou recentemente ações como a Virada Política, um dia cheio de eventos que colocam a política no centro do debate, com o objetivo de estimular conversas mais profundas do que aquelas que consegue-se nas redes sociais. Carla lembrou que “o que orienta a conversa não é a polarização, mas o ativismo (a causa que se acredita). O jovem quer aprender da política na escola, é um dos caminhos necessários”.
Lembrando sua atuação como vereador, Ricardo Young comentou que essa agressividade nos diálogos é também muito forte nos movimentos sociais. “Quando me tornei vereador, uma das minhas ações foi a criação da Frente Parlamentar pela Sustentabilidade. Esta Frente frequentemente lida com movimentos pró parques. Nestas experiências é constante nos deparamos com uma radicalização dos movimentos. Se recusam ao diálogo se, por exemplo, houver empresas na conversa. Fico pensando se isso é uma herança da ditadura, quando era necessário esse enfrentamento violento na defesa por direitos. Por que essa postura? Por que se portar de forma tão autoritária? “, questionou.
Denise Valença respondeu ao vereador trazendo a educação de novo para a pauta. “O modelo de educação reproduz o papel de ditador do professor perante seus alunos. Tudo começa na pessoa, se ela esta amedrontada, estamos criando uma sociedade de covardes. Neste contexto, o mais forte acaba prevalecendo”, lembrou.
A necessidade de uma educação que forme cidadãos mais dispostos ao diálogo foi lembrada em muitas outras participações. A percepção geral dos presentes foi de que é preciso disseminar cada vez mais a ideia de uma forma de comunicar menos violenta, que seja de fato um diálogo e não em debate, ou até uma briga. Resumindo o sentimento coletivo, Drica Guzzi concluiu com um provérbio que diz “matar um homem para defender uma ideia não é defender uma ideia , é matar um homem”.
Ricardo Young convidou ainda todos os presentes a conhecerem o movimento Vem para a Roda, que realiza encontros semelhantes ao proposto nesta Segunda Paulistana, e seguir com “o diálogo e a busca por soluções mais humanas para a política”.